sábado, 23 de novembro de 2013

192.4-6 - Seis Rosas dos Jardins de Adónis

4 – Bento de Espinosa, polidor de lentes, filho de família judaica foragida do Portugal católico para a Holanda, diz que o nosso espírito é o conjunto das nossas ideias – confusas e imperfeitas quase todas por serem temporais, mas também algumas cristalinas, perfeitas e portanto eternas. E nós acrescentamos que o florir dessas ideias ou o iluminar dessas luzes, que é a actividade de pensar, também já é espírito.
Mas todas essas ideias, que são flores ou luzes, como também a actividade de pensar, tudo será temporal e nada eterno. A não ser que tudo seja eterno, sim, mas só com a eternidade de um dia, como as “rosas dos jardins de Adónis”, de Fernando Pessoa - Ricardo Reis, para as quais a luz é eterna porque “nascem nascido já o Sol, e acabam / antes que Apolo deixe / o seu curso visível”.

5 – Nós somos realmente dotados de espírito, o qual é a realidade espiritual que produz o pensamento. Mas os pensamentos são só pensamentos, os quais portanto, enquanto tais, só existem como abstracções. Portanto, mesmo as “ideias eternas e imutáveis” não são mais que simples ideias, puras abstracções, como aliás são também os números e as figuras geométricas. Por isso é que a Matemática e a Geometria são ciências puras, pois lidam só com abstracções. Será também o caso da Metafísica, porque o ser, enquanto tal, só existirá realmente nas concretas realidades.

6 – Mas é claro que as ideias da Filosofia e sobremaneira da Metafísica, nas nossas mentes, podem ser devastadoramente poderosas. “Nada detém uma ideia quando chega a sua hora”, como alguém dizia. Os horrores perpetrados contra a humanidade por Estaline e por Hitler e pelos seus sanguinários salafrários, horrores perpetrados em nome de hediondos ideais, estão aí indelevelmente vivos, na sua descarnada crueldade contra crianças, mulheres e homens concretos e inocentes. Assim como, felizmente, também concebemos ideias e ideais poderosamente bons e belos, como é o de pensarmos uma boa justiça, uma justiça eficaz para julgar os crimes cometidos contra a humanidade, bem como outras poderosas ideias que nos conduzem a mais esferas de beleza e de bondade, a fim de que a humanidade floresça e se ilumine.

As ideias não são coisas, coisas do mundo da física, pois que, sendo do domínio da “meta-física”, elas estão para além daquela. Não são do mundo físico, mas dele nascem e a ele conduzem. Ideias e coisas boas e belas, de preferência.

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