quinta-feira, 17 de maio de 2012

64 - Uma Teoria sobre o Beijo


         1 - Olá! Para o ser humano e logo desde o seu nascimento, a primeira coisa boa ou o primeiro bem é o leite materno e tudo o que lhe está directamente associado: antes de mais, portanto, a própria chucha puxada pelos lábios e saboreada pela língua, mas depois também as duas fontes que são os seios e todo o corpo da mãe. Ao contrário, a primeira coisa má ou o primeiro mal, para o bebé, é ele tomar algum alimento deteriorado, que portanto fará mal à sua vida.
Para o bebé, portanto, mamar é amar e amar é mamar, sendo eles sempre a acção que o conduz para o seu bem, o leite, o primeiro bem e amor de todos os seus bens e amores; enquanto que odiar é a acção que o leva à rejeição do que já é mau para si, ou seja, a comida corrompida, pois que esta lhe irá prejudicar a sua vida, a qual, logo desde a nascença, é o sumo bem que ele procura defender e promover.
Para o bebé, porém, há-de vir o tempo – como há muito já chegou para a mamã - o tempo em que amar não tem só e especialmente um sentido centrípeto, um sentido que olha para a sua vida e o seu eu, mas sobretudo um sentido centrífugo, que se volta para os outros. Portanto, não é que o amor e o amar deixem de constituir para os dois, já adultos, agora o bem e o alimento espirituais das suas vidas, mas porque, então, o amor e a vida boa, para eles, e afinal para todos os humanos, está mais no dar que no receber.

2 - Aquela posição dos lábios juntos, com a língua por perto – lábios na posição de haurirem o leitinho materno, e língua sempre pronta para gostar e sentir se esse precioso e primeiro bem está em boas condições – é também, segundo acha o inspirado Alain, a posição dos lábios que beijam. O beijo, assim, é um gesto natural e cultural, um gesto simbólico com que presentificamos um ou mais bens que, por serem mental alimento da vida, queremos dar e/ou receber.
Quando uma mamã, dos seus seios, pode dar de beber ao seu bebé e não dá, ela está a negar-lhe a primícia dos bens e dos sabores daquilo que é realmente bom na vida, e bem assim a subtrair-lhe a nascente do sentido que deverá ter depois o beijo dele a algo ou alguém. A posição dos lábios do bebé para receber o leite da sua vida é a mesma que ele irá usar depois para beijar, sendo que as duas acções, uma e outra, deverão servir sempre para receber e/ou dar bens que vão alimentar vidas humanas.
De todos os beijos que damos ou daremos na vida, os primeiros são nas maminhas da nossa mãe, puxando do seu leite, o qual é, de todos os bens da vida, o primeiro e o melhor. E também odiaremos sempre o mal porque, tal como já fizemos naqueles primeiros beijos, o que sempre queremos é, em última instância, agarrar-nos à vida e defender dos perigos esse grande bem que temos.
Porque o bem e o mal, para os seres humanos, não são só e sobretudo abstracções. Aliás, realmente, o bem e o mal só existem em entidades concretas. Desde o leite bom ou leite deteriorado, até à bondade e à maldade, as quais sempre só podem existir em coisas ou pessoas boas e más.

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