A Assembleia fechou ou vai fechar, embora o nosso sangue, isto é, o nosso dinheiro, continue a correr para lá, talvez agora menos nestes compassos de espera. Lá dentro, os políticos foram parecendo bonifrates de feira, e a Assembleia foi-se assemelhando a um circo, onde eles encontraram palanque para desempenhar a sua farsa. Como é costume dele ir às feiras enquanto nelas houver alguns produtos e dinheiro para vender e comprar, o Zé Povinho, que é o dono da Assembleia da República, entrava às vezes para ver uma cenazinha do espectáculo, mas só depois de arrumar os seus negócios de compra e venda, na feira circundante. Fincados em velhas ideologias ainda vivas na cabeça deles, as quais outrora nasceram para serem aplicadas ou para interpretar realidades humanas para nós há muito mortas, os políticos foram-lhe parecendo esses bonecos de feira à marretada uns aos outros, esgrimindo argumentos tantas vezes desencarnados da concreta e viva realidade que deviam ter presente. De modo que, poucos momentos bastando para se sentir enjoado com o espectáculo, o Zé, embora em sua casa, vira as costas e deixa-os sozinhos no meio do arraial já deserto, a entreterem-se com os seus jogos estéreis de palavras. Porque eles deviam saber que a vida é sempre um rio que flui, e não estar atento a ela e aplicar-lhe receitas teóricas velhas gera inundação e desastre pela certa. Eles pensam que, nos seus sistemas ideológicos, têm todas as respostas para as perguntas da vida, mas a vida vem e muda-lhe todas as perguntas! Eles não sabem ser pragmáticos, simplesmente descendo e olhando para a crua realidade da vida em que estamos. É claro que outras razões existem a explicar o mau funcionamento da Assembleia, como é o caso do calculismo político de defesa de interesses partidários em detrimento do bem público. E depois, porque o povo não é culto nem exigente – cada cidadão ser exigente consigo para depois poder ser exigente com os outros -, nunca se promoveu entre nós a cultura da indignação protestante em relação a tudo o que funciona mal na sociedade, já que os impostos que pagamos são mais que suficientes para que tudo funcione bem! Nunca nos empenhámos de forma séria a organizar devidamente a sociedade em que vivemos. Porque cada um de nós também é a sociedade, e só com ela nos podemos verdadeiramente humanizar! Não podemos deixar de ser sociais, mas o melhor é que sejamos cidadãos activos da nossa cidade e país, e também do mundo. Temos vivido sempre ao de leve, sempre de forma muito branda. Vivemos no país do fado, sempre com a cerviz ajoujada ao peso do destino. Se os nossos navegantes de antanho também fossem assim, se não dessem uma grande sapatada em todos os fatalismos, o que é que teria acontecido? Será desta que vamos aprender, ou continuaremos alheios à circunstância social em que vivemos e que faz parte de nós? A política é uma arte nobre, talvez até a mais nobre de todas. Com efeito, para um ser humano, que coisa haverá mais sublime do que servir inventiva e generosamente a sua cidade, ou o seu país? Se os políticos que temos não são inventivos nem generosos, então têm de ir para casa! Depois deles, não haverá mais ninguém, sobretudo entre os jovens, que queira servir a cidade, de forma inventiva e generosa? (Por falta de material informático, esta nota, já pronta no último dia 31, só hoje é publicada)
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