domingo, 8 de março de 2015

281.1-2 - Enrolando o Fio do Aéreo Papagaio

1 – Olá, amigas e amigos! Depois dos textos 265 e 273, este é o derradeiro texto da tríade inspirada em Hannah Arendt.
Somos então antes de mais corpo, antes de mais matéria. Por isso, a nossa primeira atenção – flor esta nascendo do corpo mas já sendo mental – deve ir para o que é corporal ou material. São os nossos sentidos que, por estímulos neles recebidos, nos trazem notícias desse mundo exterior a nós. Ou então, somos nós que, através dos mesmos sentidos, tomamos a iniciativa de por eles as irmos buscar. Mas também os mesmos sentidos, e agora também o(s) sentido(s) interno(s), nos dão informações do que se passa no nosso corpo, externa e internamente.
Mas também somos mente. Pressentimos isso através dos nossos sentidos, mas é sobretudo pela própria mente, voltada para si própria, reflexamente, que o vemos claramente. A mente recolhe os dados dos sentidos, transforma-os em emoções, sentimentos e ideias, cria mundos simbólicos quase inimagináveis, e desfruta afinal de todo esse alimento.

2 - É sobretudo olhando e sentindo com atenção o nosso corpo – externa e internamente – que nós ficamos a saber que somos tempo. É certo que o tempo também corre por dentro da nossa mente: na infância somos uma nascente a fervilhar de perguntas, o mundo vai-se-nos abrindo em cores de esperança, mas depois, pouco a pouco, rodando os anos, as cores do nosso mundo vão-se tornando sombrias, pesadas, cedendo o passo às certezas, realistas certezas, as perguntas da infância. Mas aquela certeza de que somos tempo, de que somos seres com prazo de validade, é olhando com atenção para o corpo que a colhemos: primeiro uma incipiente ruga a ensombrar o olhar, depois já uns cabelinhos brancos na cabeça, a seguir o incómodo coxear de uma perna, uma aflitiva dor no coração e por aí adiante até ao fim do nosso tempo.

Por tudo isto é que, entre os humanos, nesta contraposição que sentimos e fazemos entre o corpo e a mente, se arreigou a convicção da imortalidade: vemos claramente que o nosso corpo é mortal, mas que talvez, da irremediável morte, se possa salvar a etérea mente.

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