1 - Olá, amigas e amigos! Com este
Deus que é (só) a sua procura - como já vimos no texto anterior sobre o romance
de Nikos - muito do que vem a seguir na mesma narrativa se concilia muito bem.
É logo o caso da obediência à vontade de Deus:
“- Não há alegria maior – disse
Francisco – do que obedecer à vontade de Deus. E sabes porquê, irmão Leão? (…)
Porque, no fundo de nós mesmos, não desejamos afinal senão o que Deus quer (…)
Obedecer à vontade de Deus significa obedecer à nossa própria vontade, a mais
íntima e secreta”.
2 - Porém, Leão, que já tinha
intervindo, põe agora a Francisco um não pequeno problema: “ - Mas por vezes
temos muitas vontades ao mesmo tempo, e eu pergunto como pode reconhecer-se a
de Deus”. “- É a mais dura – respondeu Francisco, soltando um suspiro” (p. 97).
Esta dureza radical com que
Francisco pretende relacionar-se com Deus, e que terá surpreendido o irmão Leão,
já tinha merecido assinalado reparo por parte do bom e velhinho bispo de Assis:
“- Tem cautela – disse-lhe em tom baixo – tu exageras …” (p. 89).
De facto, encontrar Deus numa abraço
a um pecador ou a um pobre, ou sobremaneira encontrá-lo ao abraçar e ao beijar
nos lábios um leproso, é realmente um exagero, não é?
3 - Depois de Francisco e Leão terem
caído na vertigem de pensarem que Deus poderia ser (só) “a procura de Deus” -
como já se disse no texto anterior -, Leão cobriu Francisco “com uma grossa
manta de lã, mas ele afastou-a bruscamente, dizendo: “- Quero ter frio”.
Assim procedendo, Francisco escolhe
realmente a sua vontade mais dura. Francisco é realmente um exagerado; ele quer
mesmo deliberadamente sofrer. Ele quer sofrer … mas não é masoquista! Porque, para
si, a dor, o sofrimento, não são fim em si mesmos! Ele quer ter frio e fome e
sede … para se abrir e saciar de Deus, sumo prazer ou bem para si, suma
felicidade! (ver texto 147).
Mas é no abraço de amor ao pobre ou
ao pecador, é ao abraçar um leproso e ao beijar-lhe o rosto a decompor-se, que
ele, de si mesmo se esvaziando, neles encontra o seu Deus.
4 – Por certo que Francisco terá
conhecido uma famosa passagem de uma carta atribuída ao apóstolo João, a quem
se atribui também o mais espiritual ou o menos terreno dos quatro evangelhos
canónicos. Passagem em que, num contexto em que se inculca a importância e a
urgência do amor, se formula a seguinte pergunta: “quem não ama a seu irmão, que
vê, como pode amar a Deus, que não vê”? Mas já um pouco atrás, na mesma carta,
se tinha dito que nós só podemos conhecer
Deus se cumprirmos o amor ao próximo.
Na realidade, o que está fora do
âmbito do nosso conhecimento, que sempre nos começa nos nossos sentidos, não
faz parte do nosso mundo, não existe para nós. Por isso é que Deus não existirá
para nós, por não conhecido, se não amarmos o próximo. Ele é amor, e só no amor
ao próximo, que vemos, o podemos conhecer e trazer para habitar no nosso mundo.
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