sábado, 13 de outubro de 2012

98 - Comissários


Comissários

Do olimpo
descendo como um raio de sol, o pai da luz
apeou em terra para se encontrar com europa, a sua nova paixão. Pelo caminho ainda teve de se transformar em touro, mas depois, assumindo vulto humano com o que logo se evolou o susto da menina, ele
enregou a sorrir-se muito para ela e edecetra coisa e tal … : zeus, o pai dos deuses, deus imortal, enamorado de uma menina não divina mas humana, e por isso mortal!
Naquela tarde, pois,
riram muito os dois e cantaram; comeram frutos doces e beberam ambrósia, dançaram muito agarradinhos por um largo trecho, mas depois, declinando o sol, já um tanto cansados dos artelhos,
acoitaram-se ali perto num palheiro de feno seco de pastores rodeado de silvas, por acaso um palheiro que, se hoje fosse, só por inconcebível e portanto imperdoável descuido da alta autoridade, é que ainda não tinha levado em cima com a necessária tributação sobre imóveis.
Seguiram-se vários filhos, meninas e meninos, cada um deles fundando depois a sua tribo. Nesses tempos, europa era muito amada pelo deus da luz, mas depois, porque os filhos e suas tribos foram ficando desavindos entre si por invejas e ganâncias e outras malandrices, e também porque a menina europa foi trocada por outras prendadas meninas mortais de mais recentes e divinas paixões, o libidinoso amante nunca mais voltou. Quando muito, vai agora enviando os seus comissários, esses sabichões de teorias não experienciadas que, mesmo assim, eles aplicam às tribos que consideram madraças.

É por isto que algumas destas tribos já carregam,
monte acima, por castigo da suposta madracice, a sua pesada pedra: carregam-na até ao alto, depois poisam-na lá no topo como se lhes manda …mas a pedra logo rola
por aí abaixo até à base. “Assim, não vale a pena carregá-la”, dizem as tribos. “Não, não”, respondem os comissários, “é preciso levar de novo a pedra para o alto da colina”. “Mas agora”, tornam elas, “isto já não é uma pedra, isto é um pedregulho”! E quando o pedregulho é carregado e depois poisado
lá em cima, logo se vê que toda essa canseira se torna de novo inútil porque também o pedregulho rola
até aos infernos. Mas os comissários insistem que as tribos têm de continuar, sem poderem desanimar: “vá, carreguem mais outra vez a pedra porque, lá em cima, está o céu”!

E assim andam as tribos mais aflitas carregando pedregulhos cada vez maiores, pedregulhos enormes, entre o inferno e o céu, abandonadas do seu pai deus e da sua mãe europa, e só entregues ao desnorte e às obstinadas ordens dos comissários. O céu continua como horizonte e ambição, sim senhor, mas a realidade é cada vez mais só o inferno.

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