sábado, 14 de junho de 2014

221.3 (de 5) - Sobre a Morte

            3 - O problema, portanto, não está na morte. O problema está em nós, que dela temos medo.
            Na sua obra A Vida, o mesmo autor afirma; “Temos medo de morrer. Para acabarmos com esse medo, temos de entrar em contacto com a morte, não com a imagem que o pensamento criou da morte (…) De outra forma, o medo nunca cessará, porque a palavra morte gera medo, e nós nem sequer queremos falar nela (…) Para descobrirmos o que é viver, tal como para descobrirmos o que é morrer, temos de entrar em contacto com a morte; isto é, temos de pôr um fim, em cada dia, a tudo o que conhecemos. Temos de pôr um fim à imagem que construímos de nós mesmos. (p.340)
            E na página seguinte acrescenta: “Porque têm medo da morte? Não será porque vocês não sabem como viver? Se soubessem viver inteiramente, teriam medo da morte? Se vocês amassem as árvores, o pôr-do-sol, os pássaros (…); se vocês estivessem atentos ao homem e à mulher que choram, aos pobres, e se realmente sentissem amor no vosso coração, teriam medo da morte? (p.341)
            Impõe-se então que, para percebermos verdadeiramente a morte, temos, antes de mais, de nos compreender globalmente a nós mesmos.
            Na obra que vem sendo mencionada, o autor explica: “Enquanto pensarmos em termos de tempo, continuará sempre a existir o medo da morte. Aprendi, mas não descobri o essencial, e antes de morrer, tenho de o descobrir (…) Todo o nosso pensar se baseia no tempo (…) e é com essa mente que nós tentamos descobrir o que é ser imortal (…) Se quiser descobrir a verdade, não amanhã, mas agora, de forma directa, não deverei eu – o “eu”, o self que está sempre a acumular, a lutar e a perpetuar-se por meio da memória – deixar de existir? Será que não é possível morrermos enquanto estamos vivos (…) deixando realmente de acumular através da memória, deixando assim de dar continuidade ao “eu”? (p. 304)
            E continua. “ Para conhecerem (a morte), vocês têm de morrer cada dia para tudo (…) para que possam, como seres humanos, ser novos, frescos, jovens e olhar para ela. (…) É somente quando vocês morrem que existe amor. Uma mente que está assustada não tem amor (…) Portanto, temos de viver cada dia a morrer – a morrer, porque então estaremos em contacto com a vida”. (p.344)

            E conclui.”Certamente no acabar existe renovação, não é verdade? É apenas na morte que algo novo passa a existir. (…) Aquilo que continua não tem nenhum renascimento, nenhuma renovação. Portanto, no morrer a cada dia existe renovação, existe um renascimento. Isso é a imortalidade. Na morte existe imortalidade (…) No morrer do “eu” a cada minuto existe eternidade, existe imortalidade, existe algo a ser experimentado (…) Quando vocês deixam de ter medo, porque a cada minuto há um terminar e por conseguinte uma renovação, então estarão abertos ao desconhecido. A realidade é o desconhecido. A morte também é o desconhecido. Mas dizer que a morte é bonita, (…) porque vamos perpetuar-nos no além e todos esses disparates, não é algo real. O que é real é ver a morte tal como ela é – um terminar; um terminar no qual há renovação, um renascimento, não uma continuidade. Porque aquilo que continua entra em decadência; e aquilo que tem o poder de se renovar é eterno. (p.345)

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