Olá! Sancho e Serafim eram
bons amigos de uma amizade antiga, que agora se alimentava sobretudo de longas
conversas passeando pela avenida, e também de quando em vez de apetitosos
almoços na taberna do Ti Zé Lampreia.
Naquela manhã de sol e de céu limpo, os dois
passeavam e conversavam longamente sobre se nós, seres humanos, temos a capacidade
de conhecer realmente as coisas do mundo em que vivemos.
É claro que, a este
propósito mas também a outros, Serafim, mais dependurado das nuvens, tinha opiniões
diversas das de Sancho, mais agarrado à terra.
- Olha que muitas vezes –
dizia Serafim – os nossos sentidos enganam-nos: pensamos que isto é uma coisa,
e afinal é outra. Por outro lado, e também não raro, nós temos sonhos tão
claros e nítidos que parecem mesmo realidades. Nesta última noite, por exemplo,
eu sonhei que nós dois e nossas famílias estávamos no Zé Lampreia a comer um
galo assado no forno com batatinhas, e ainda me lembro vivamente, com toda a
nitidez, de todos os pormenores da boa circunstância em que estávamos e dos
bons sabores da refeição! Quem sabe se durante o dia, quando estamos acordados,
não vemos só coisas imaginadas como que em sonhos, sem nunca conhecermos as
verdadeiras realidades?
- Ouve lá, ó Serafim, agora
vou eu almoçar sozinho. Já andámos bastante e falámos muito, está na hora da
refeição e já sinto muita fome.
- Mas não achas que os
sentidos te podem enganar?
Sem retorquir, Sancho deu
meia volta e ensaiou os primeiros passos.
- Então não me convidas? – perguntou
Serafim.
- Mas tu já almoçaste, não
foi? Não comeste galo com batatinhas?
- Não almocei nada! E também
já sinto como tu a barriga a dar horas!
- Mas a tua barriga não te
engana?
- Ah, não, sei perfeitamente
que não!
E sem que a conversa beliscasse
a recíproca amizade, lá foram os dois almoçar. Não comeram um real e muito
menos um sonhado galo, mas sim um real e bem delicioso ensopado de enguias.
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