quinta-feira, 28 de março de 2013

141 - Cidadania e Ecce Homo


Eu hei-de nunca mais ir a Lesboa
à Lesboa do faduncho que “partiu
sem dizer adeus nem nada” e disse
que “a culpa era toda minha”;
prefiro o vira do campo e o tiroliro
E os martelos do piano de Chopin

Eu hei-de nunca mais ir à Assembleia
ouvir e ver os residentes
 entrechocando as cristas;
prefiro as cabeçadas dos bonecos de Santo Aleixo,
os juncos das margens das ribeiras
 e as cristas dos pinheiros

Eu hei-de nunca mais ir a tribunais
 onde as horas param e nunca mais amanhece,
nem aos gabinetes sombrios,
em Lesboa e em Bruxelas,
dos que tomam decisões
à medida só de seus obstinados entrolhos;
prefiro de novo os meus familiares pinheiros
subindo ao alto desde o musgo do chão

E quando chegar a decisiva hora do voto
votar em branco, mas nulo não,
como é próprio de democrata cidadão,
salvo se aparecer um que outro
abnegado experimentado estadista,
logo lhe levando eu a mais viçosa rosa
do meu exíguo jardim

E então, já reconciliado com a capital do meu país,
convidarei todos os grandes da Europa
a virem sentar-se  a contemplar o Ecce Homo:
humilde homem-deus o pintou, se pintando,
tão antigamente tão desconhecidamente
agora sobremaneira tão esquecidamente

Metido num museu antigo e em sua pintura é só um,
mas cá fora são muitos:
eles andam por aí, andrajosos e pedintes,
a irem morrendo pelas ruas do meu país,
da Europa do sul pela do norte escorraçados,
mais uma incontável multidão dos outros continentes

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