Há
coisas que me fascinam: uma é olhar o mar,
outra
é olhar uma árvore, se possível
com suas flores ou frutos.
Digo
olhar, querendo significar contemplar,
se
não mesmo ficar fascinado.
Qual
dos dois é maior: o grande oceano, ou eu?
É
este mar oceano, aqui à minha frente,
ora
golfando raivoso como leão enfurecido,
ora
mansinho como cordeiro acabadinho de nascer
e
a ser lambido pela mãe ou pela areia,
ou
é esta luzinha que eu sou, consciência de mim,
desta
minha insignificância, mas também consciência
da
vida, dos oceanos e do universo?
Se
há mares ou oceanos diferentes,
também
há árvores de muitas espécies, todas elas belas,
quase
sempre na sua incontaminada beleza natural:
há
a cameleira, com as suas flores multicolores
no
denso fundo verde das folhas;
há
os dióspiros, esses frutos feitos de fogo, divinos,
pendentes
da mãe árvore toda despida de folhas;
há
o indomável cedro, com a sua nunca saciada
sede
de subir às alturas, pedida, ela,
pelas
raízes que o aprofundam na terra
Mas
hoje, com este céu e este mar de todo limpos,
não
nos detenhamos aqui por mais tempo no promontório,
não
só porque o vento se levantou e agora corre frio,
como
também porque sentimos alguma urgência
em
fazer caminho para o vale dos cedros,
onde
hoje há, brincando, um grupinho de crianças
E
agora, já no vale dos cedros,
neste
santuário morno, sem vento
(só
passando ele, de manso, pelos píncaros)
e
onde, depois do convívio com elas e com
os mestres,
o
álacre gorjeio das crianças se extingue com a distância,
eu,
sentado solidamente no chão, costas direitas
dadas
ao dorso do generoso cedro,
(que
partilha comigo a profunda seiva da terra
e
permuta o halo aéreo da respiração)
inspiro
profundamente com ele. E tão
profunda
e altamente inspiro
que
logo ali o inspirar vira longo bocejo,
ali
mesmo sob o lago dos olhos,
depois
expirando lenta e longamente
descendo
ao profundo da terra,
eu
e ele, o cedro, daí colhendo seiva,
ela
se entranhando nele, e por ele em mim,
e
assim por diante, sem tempo, em movimento
bipolar,
que é o movimento da vida …
Entre
a terra e o céu, cedro e eu, nós estamos,
(nítido
espelho azul-oceano em que nos vemos),
pois
é deles que nos alimentamos:
Almo
aéreo ar da árvore,
seiva
funda, verde e azul, da terra,
meu
alimento morno, vem,
fica
comigo
Dedico este texto a meu pai, cujo
aniversário hoje ocorreria.
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