quinta-feira, 10 de janeiro de 2013

124 - Tempos de Apocalipse


1 - Olá, amigas e amigos! Bem se vê que, por sua própria culpa, a vida da Humanidade se está complicando de uma forma dramática. Em bom rigor, porém, devíamos estar aqui a referir-nos só à parte da Humanidade de raiz ocidental. Mas … como assim? se, hoje em dia, com toda esta globalização, quase todas as particularidades regionais se esfumam?
Na América, numa escola, às mãos de um tresloucado carregador de armas e munições, um bando de crianças e ainda outras pessoas pereceram; na Índia, uma jovem senhora, usada e abusada à tripa forra por uma chusma de criminosos, veio a falecer; em Luanda, à saída de uma assembleia da IURD que prometia resolver todos os problemas de cada um, vários fiéis foram espezinhados e mortos numa saída em pânico; e até, aos políticos da América e da Comunidade Europeia, só a iminente queda no abismo, cavado fundo à sua frente, os move a encontrar soluções inadiáveis.

         2 – Durante longos mil anos, na Europa medieval ocidental, vigorou uma sociedade assente na Religião, na Tradição e na Autoridade, os três pilares de onde procedia, para toda a gente, a mundividência e as regras necessárias para as pessoas guiarem as suas vidas.
         Mas logo no início da Idade Moderna - aliás como seu mais importante constituinte -, apareceu o racionalismo, segundo o qual se centrava na razão de cada um a capacidade de se conhecer a si próprio e conhecer o mundo, e bem assim poder orientar a sua vida. Durou e foi-se acentuando por vários séculos esta orientação, tempo mais que suficiente para que, através desta mesma tendência, os três referidos pilares sociais fossem crescentemente corroídos e perdessem a validade, como princípios orientadores.
         Pela razão - pensava-se - o ser humano será capaz de criar o melhor dos mundos para cada um e para a sociedade em que está inserido. E assim se foram desenvolvendo a ciência, a técnica, também o Estado Social, tudo coisas muito boas para darem segurança e bem-estar, pelo menos material, a cada ser humano.
         Diga-se agora que este espírito racional, enquanto tal, é o factor mais importante para que as pessoas possam por si próprias, interiormente, tomar conta das suas vidas e ser mentalmente autónomas, sem terem muita necessidade de se apoiar naqueles três antigos pilares. Mas o que aconteceu foi que tal racionalismo, para além de criar nos indivíduos um exagerado optimismo - que tem funcionado como um dos piores males para a Humanidade –, levou só a alguma segurança e bem-estar materiais, sem vertebrar os indivíduos para a sua autonomia mental.
         Acresce ainda que, nestes últimos tempos, o capitalismo selvagem tem soltado sem entraves as suas garras sobre as nações, desencadeando crises financeiras e económicas sobre todo o globo e deixando atrás de si não só um rasto de destruição e miséria como também profunda inquietação nas pessoas. Elas foram apeadas e desceram fundo, em relação àquele optimismo e àquele estado de segurança, e, porque se desligaram dos antigos pilares que costumavam dar segurança e sentido para a vida, sentem-se agora perdidas, abandonadas, sozinhas, sem terem quem as guie.

         3 – Tempos muito difíceis são estes para a Humanidade. Tão difíceis que muitos indivíduos já se imaginam estar para lá do fim do mundo e que ... o apocalipse está aí e é agora.
         E agora, depois do fim do mundo e de de novo nascermos, que faremos todos e cada um com a nova humanidade, oferecida e posta agora em nossas mãos para a vivermos? Todos, pois! Não somos assim tantos como isso, neste vasto Universo! Talvez até que, só na boquita de uma criança, haja mais microvidazinhas do que todas essas vidas humanas grandes do mundo!
         Que faremos agora, todos, com a nossa humanidade? Quem nos ilumina? Quem nos guia? Que revelação ou revelações nos trará o apocalipse? Qual será a revelação final? Que conteúdos terá?
 Ora, tal revelação poderá começar por termos de juntar e aproveitar alguns cacos ainda com préstimo, cacos daqueles três pilares que lá atrás fizemos desabar, e até talvez possamos encontrar pedras preciosas, genuínas, que possam estar perdidas no meio desses escombros. Teremos de valorizar os afectos – nunca como agora sentidos, porque originais e novos – valorizar os afectos entre os humanos porque cada um de nós só poderá continuar a viver convivendo com outros. Teremos de comer o pão da dúvida – nosso principal alimento mental – mas também, com outros companheiros, tentar fazer da dúvida uma probabilidade ou até uma certeza. Teremos de preservar, enfim, a nossa humanidade, não só profundamente nos ligando uns aos outros como também ao húmus da Terra, que ele é que nos faz humanos.
         E sobretudo, sem menosprezar o sagrado que muitos possam ainda encontrar nas religiões, o que temos urgentemente de valorizar é o sagrado humano, o sagrado que há em cada pessoa e nas nossas instituições democráticas. A esta resplandecente luz, sagrada luz, aquelas crianças americanas mortas, aves ainda quase implumes e sem jamais poderem voar, e bem assim aquela jovem indiana usada e abusada e também sem jamais poder encontrar o amor, todas serão para nós quase deusas, sacratíssimas deusas, e ainda garantia de que acções tão execrandas não podem repetir-se.
         À mesma resplandecente e sagrada luz, por contraste, também serão vistos os que se entregam a explorar com usura e especulação o dinheiro sangue das nações, esses tenebrosos tubos digestivos sem alma, comilões insaciáveis de dinheiro, tubos digestivos a engrossarem à volta de si mesmos, cilindros de sebo que, por concordância e decisão das nações, terão de rolar para um abismo de trevas.
Assim, se cumprirmos estas revelações, bendito apocalipse que nos vem perturbar a alma. É um novo nascimento.

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