Olá, caras amigas e amigos que trabalham ou residem no lar onde estive, e ainda muitos outros amigos e amigas espalhados pelo mundo!
Só porque gosto muito da vida, é que já várias vezes aqui falei da morte. Lembro de passagem que, a este blog, três meninas e eu demos o nome de “O Clube dos Poetas Vivos”, e por subnome “O fascínio pela vida, pela vida breve que nos possui neste planeta azul” (texto 5). Lembro ainda que o mesmo nasceu inspirado em pensamentos sobre a vida e sobre a morte (textos 1-4), e veio à luz no vivo contexto de um lar de meninos velhinhos que, tal como aquele muito amigo senhor Manuel, se iam despedindo dos que vivos ainda cá ficávamos (1-5).
Para os outros seres vivos, são necessários só erva ou terra ou também carne, água e ainda luz … e mais nada. Nem tempo é preciso porque, para eles, simplesmente não há tempo; nós é que precisamos dele para irmos medindo o seu crescimento. Nascem e aparecem-nos feitos, já prontos para passarem a sua vida. Terá uma macieira, para dar em devido tempo suas flores e frutos, de passar por doze anos de escolaridade obrigatória, e ainda de aprender durante toda a vida até morrer? Logo de pequenina, ela nos aparece de todo como macieira.
Quando eu era criança, lembro-me de ter visto um bezerrinho a nascer. Já no chão do curral, a mãe vaquinha lambeu-o ternamente, por três vezes, e logo ele, primeiro titubeante das patitas dianteiras, logo depois se pôs aos pinotes naquela mornidão do curral, assim pronto nos aparecendo a nós e ao mundo. Ao passo que, só vivendo e existindo no tempo, o ser humano precisará de ir crescendo por dentro, de ir desenvolvendo responsavelmente o projecto da sua vida ainda não feita … de modo que só na sua morte ele nos aparece pronto, ele nos aparece feito.
Quanto aos outros seres, eles iniciam a sua vida logo que estão prontos e acabados para viverem, enquanto que a vida do ser humano só está acabada … quando deixa de ser. A vida humana só assume a sua plena realidade quando acaba na morte. Além de limitar a vida humana, a morte, como diz Arendt, “também lhe confere uma plenitude silenciosa, arrebatando-a do fluxo incerto a que todas as coisas estão sujeitas”. Com o seu nascimento, no mundo, o ser humano já nos aparece viável, sim, mas a sua vida só nos aparece definitivamente na morte, esteja esta ainda longe, ou já perto.
Pronto e feito e acabado o ser humano, para quê? É que a morte é morte mesmo! Aquele ser morreu e nunca mais aparecerá aos nossos estimuláveis sentidos!
Morreu, sim, mas algo profundamente seu, bem vivo, fica no mundo simbólico dos que, tendo-o conhecido, vivos continuam. Diremos melhor: com a sua morte, algo dele, bem vivo, “nasce” no nosso mundo simbólico. Porque é a sua morte que, para nós, nos ilumina a unidade e a inteireza da sua vida, até à plenitude, e mesmo cada pormenor da sua vida também a essa plena luz se pode ver. Suas palavras e gestos, ditas e feitos no tempo, não podem mais ser desditas ou anulados, porque tudo foi esculpido na eternidade.
A crónica da Maria José Nogueira Pinto, escrita uns dias antes da sua morte, não a pude ler, embora dela tenha andado à procura. Pelos órgãos de informação, soube que a Maria José escreveu no seu texto, por exemplo, mais ou menos isto: “Cá estou eu no meio da vida. Não vou deixar cair os braços, mas também não vou esbracejar”. Cá está um caso evidente de como tais palavras, escritas naquele momento e naquela situação, assumem uma especial densidade e se tornam exemplares, não só para definir a globalidade da sua vida, como ainda para a conduta de quem fica.
Mas eu nego-me a falar só desse caso, com solenes cerimónias do seu passamento, na capela da sua casa no Campo Grande. Falo também dos esquecidos, dos que não têm casa e muito menos capela, nem andam na boca nem na caneta dos meios de comunicação social; dos desprotegidos da boa fortuna em toda a sua vida, com virá a ser o caso daquele homem muito querido de setenta e muitos anos que um dia me ofereceu logo pela manhã um copito e tinha ainda uns tomates muito saborosos para si e para a companheira (11.1), e também o caso daquela moleirinha velhinha de alma alva (11.2), e de grande parte da Humanidade.
Este texto podia ter sido escrito na movediça areia de uma praia, na laje dura e lisa de uma montanha, em papel contra a parede branca daquele abençoado cemiteriozinho (13.2) … Onde foi escrito, afinal já bem não sei. Mas sei que foi no tempo!
Somos seres de tempo, datados, com prazo de validade, seres de vida e de morte, seres mortais. E é à luz da morte, que sempre trago comigo e me ilumina, que se me aguça ao paladar o delicioso sabor do vinho da vida.
Só porque gosto muito da vida, é que já várias vezes aqui falei da morte. Lembro de passagem que, a este blog, três meninas e eu demos o nome de “O Clube dos Poetas Vivos”, e por subnome “O fascínio pela vida, pela vida breve que nos possui neste planeta azul” (texto 5). Lembro ainda que o mesmo nasceu inspirado em pensamentos sobre a vida e sobre a morte (textos 1-4), e veio à luz no vivo contexto de um lar de meninos velhinhos que, tal como aquele muito amigo senhor Manuel, se iam despedindo dos que vivos ainda cá ficávamos (1-5).
Para os outros seres vivos, são necessários só erva ou terra ou também carne, água e ainda luz … e mais nada. Nem tempo é preciso porque, para eles, simplesmente não há tempo; nós é que precisamos dele para irmos medindo o seu crescimento. Nascem e aparecem-nos feitos, já prontos para passarem a sua vida. Terá uma macieira, para dar em devido tempo suas flores e frutos, de passar por doze anos de escolaridade obrigatória, e ainda de aprender durante toda a vida até morrer? Logo de pequenina, ela nos aparece de todo como macieira.
Quando eu era criança, lembro-me de ter visto um bezerrinho a nascer. Já no chão do curral, a mãe vaquinha lambeu-o ternamente, por três vezes, e logo ele, primeiro titubeante das patitas dianteiras, logo depois se pôs aos pinotes naquela mornidão do curral, assim pronto nos aparecendo a nós e ao mundo. Ao passo que, só vivendo e existindo no tempo, o ser humano precisará de ir crescendo por dentro, de ir desenvolvendo responsavelmente o projecto da sua vida ainda não feita … de modo que só na sua morte ele nos aparece pronto, ele nos aparece feito.
Quanto aos outros seres, eles iniciam a sua vida logo que estão prontos e acabados para viverem, enquanto que a vida do ser humano só está acabada … quando deixa de ser. A vida humana só assume a sua plena realidade quando acaba na morte. Além de limitar a vida humana, a morte, como diz Arendt, “também lhe confere uma plenitude silenciosa, arrebatando-a do fluxo incerto a que todas as coisas estão sujeitas”. Com o seu nascimento, no mundo, o ser humano já nos aparece viável, sim, mas a sua vida só nos aparece definitivamente na morte, esteja esta ainda longe, ou já perto.
Pronto e feito e acabado o ser humano, para quê? É que a morte é morte mesmo! Aquele ser morreu e nunca mais aparecerá aos nossos estimuláveis sentidos!
Morreu, sim, mas algo profundamente seu, bem vivo, fica no mundo simbólico dos que, tendo-o conhecido, vivos continuam. Diremos melhor: com a sua morte, algo dele, bem vivo, “nasce” no nosso mundo simbólico. Porque é a sua morte que, para nós, nos ilumina a unidade e a inteireza da sua vida, até à plenitude, e mesmo cada pormenor da sua vida também a essa plena luz se pode ver. Suas palavras e gestos, ditas e feitos no tempo, não podem mais ser desditas ou anulados, porque tudo foi esculpido na eternidade.
A crónica da Maria José Nogueira Pinto, escrita uns dias antes da sua morte, não a pude ler, embora dela tenha andado à procura. Pelos órgãos de informação, soube que a Maria José escreveu no seu texto, por exemplo, mais ou menos isto: “Cá estou eu no meio da vida. Não vou deixar cair os braços, mas também não vou esbracejar”. Cá está um caso evidente de como tais palavras, escritas naquele momento e naquela situação, assumem uma especial densidade e se tornam exemplares, não só para definir a globalidade da sua vida, como ainda para a conduta de quem fica.
Mas eu nego-me a falar só desse caso, com solenes cerimónias do seu passamento, na capela da sua casa no Campo Grande. Falo também dos esquecidos, dos que não têm casa e muito menos capela, nem andam na boca nem na caneta dos meios de comunicação social; dos desprotegidos da boa fortuna em toda a sua vida, com virá a ser o caso daquele homem muito querido de setenta e muitos anos que um dia me ofereceu logo pela manhã um copito e tinha ainda uns tomates muito saborosos para si e para a companheira (11.1), e também o caso daquela moleirinha velhinha de alma alva (11.2), e de grande parte da Humanidade.
Este texto podia ter sido escrito na movediça areia de uma praia, na laje dura e lisa de uma montanha, em papel contra a parede branca daquele abençoado cemiteriozinho (13.2) … Onde foi escrito, afinal já bem não sei. Mas sei que foi no tempo!
Somos seres de tempo, datados, com prazo de validade, seres de vida e de morte, seres mortais. E é à luz da morte, que sempre trago comigo e me ilumina, que se me aguça ao paladar o delicioso sabor do vinho da vida.
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