1 – Olá, amigas e amigos! Há valores? Valores mesmo reais que
fundem uma verdadeira moralidade objectiva entre os humanos? A dignidade do ser
humano e das nações? A justiça, a fraternidade entre os homens, a liberdade, o
amor? A preservação do planeta-nossa-casa-comum? Enfim, haverá mesmo o bem e o
mal?
Na segunda grande guerra mundial, que assolou toda a Europa e
grande parte do mundo, morreram 59 milhões de pessoas, de entre as quais cerca
de 6 milhões de judeus, e foram destruídos milhão e meio de edifícios. Hitler, fuhrer
da Alemanha, essa sinistra figura, depois de atacar e ocupar cruelmente a
Polónia e declarar que aniquilaria todos os judeus, foi continuando a fazer as
suas hediondas conquistas e abrindo os tenebrosos campos de concentração e de
extermínio.
Por seu lado, Churchil diz ao seu povo: “Não tenho nada para
oferecer, além de sangue, trabalho, lágrimas e suor”. E no parlamento declara
que a sua política vai ser: “ fazer a guerra contra a tirania monstruosa, nunca
ultrapassada no catálogo negro e lamentável dos crimes humanos”.
Quase logo ao princípio da guerra mas já com a Polónia
ocupada pelos nazis, um oficial alemão, tremendamente chocado com o que vê,
escreve à sua mulher e termina assim a sua carta: “Tenho vergonha de ser
alemão”.
Mas os horrores continuam e, entre eles, abriam-se mais campos
de concentração, de trabalho forçado e de extermínio. Começam então a sair de
Auschwitz vagões carregados de roupas e outros pertences dos que aí tinham sido
assassinados. Por coincidência, no local de destino dessa roupa, está um pastor
protestante alemão, também ele detido, que pôde testemunhar dois desses desembarques.
“Ficámos abalados até ao mais fundo das nossas almas quando chegaram os
primeiros transportes de calçado de criança: nós, homens habituados ao
sofrimento e ao choque, tivemos de fazer um grande esforço para conter as
lágrimas”. Mas um tempo depois, mais milhares de sapatos de criança chegavam: “para
nós”, disse o mesmo pastor, “isso foi a coisa mais horrível, mais dolorosa, a
pior coisa que nos aconteceu”.
Outra vez a pergunta: haverá mesmo valores que fundem a nossa
maneira humana de conduzir a vida? Onde se poderá evidenciar a verdadeira realidade
desses valores que se podem defender e violar?
2 – Se consultarmos um perito em Ética, mais explicitamente
em valores morais e políticos, ele dirá que há valores relativos, mas também
valores objectivos. Os primeiros são aceitos e seguidos só por determinados
grupos ou sociedades. Os segundos são valores objectivos, que também podemos
chamar universais por serem aceitos e seguidos universalmente, e portanto não
serem exclusivos de alguns grupos ou sociedades. Tais valores são defendidos
mesmo por quem, em determinadas circunstâncias, os tenha de cumprir contra o
seu interesse.
Desses valores objectivos ou universais, são exemplos o valor
da tolerância, os valores fundamentais da vida humana e da justiça. De facto, em
nenhuma sociedade se aceitam o homicídio e o roubo cometidos de forma
indiscriminada. E quanto à tolerância, ela é tão universal que nós até podemos
(e devemos) ser intolerantes para com quem não pratica a tolerância. Quanto à
preservação do nosso meio-ambiente e do nosso planeta, também todos compreendem
e aceitam este valor, embora haja ainda muitos que não o cumprem por motivos
mesquinhamente interesseiros.
Mas quaisquer valores – sejam eles relativos ou universais – só
são mesmo valores reais quando eles forem postos em prática ou violados pela
acção humana, e os efeitos ou sinais do seu cumprimento ou violação se tornarem
evidentes em nós e no mundo sensível em que vivemos. Porque, antes da acção
humana, que os cumpre ou viola, eles são em nós simples conceitos ou ideias ou
princípios mentais, como até já sugerimos nos textos 1 e 3 deste blog. Meros
princípios, sim, mas, mesmo assim, poderosos princípios. Tão poderosos que são
eles (ou o seu contrário) que, quando levados à prática ou por esta repelidos,
vão orientando ou desorientando o mundo.
No mundo sensível em que vivemos, os valores e contra-valores nascem portanto como abstracções nas
nossas mentes, e só depois se concretizam na e pela nossa acção, em nós
próprios e na nossa circunstância, gozando nós desses benefícios depois, ou
sofrendo por essas maldades. Do bem e do mal que praticarmos somos nós os responsáveis:
o mal podíamo-lo ter evitado, mas agora há que corrigi-lo, se possível.