domingo, 28 de junho de 2015

308 - Múrmura Água

Alimentando a luxúria de altos canaviais,
há a múrmura água de um ribeiro lento:

é o mais lânguido e doce murmúrio do mundo

quarta-feira, 24 de junho de 2015

307.2-3 - A Transmigração das Almas

            2 - Segundo o cristianismo, a alma humana não está sujeita a esse longo ciclo de vidas, cada uma destas em seu corpo diferente, pois que, depois da morte do próprio corpo, tudo desemboca numa eternidade de salvação ou condenação. Mas quem navega na doutrina da transmigração das almas, acredita que elas terão de viver e viajar por vários corpos, condenadas que estão a percorrer todo o ciclo da vida. Pelo caminho, por meio de exercício e da ascese, terão de se ir descartando dos sucessivos corpos, terão de ir fugindo da vida, até desaparecerem no nada ou no universo. Aliás, para Buda, (ao contrário do cristianismo), uma das três grandes marcas da existência humana é a ausência de uma identidade permanente em nós, portanto sem uma alma ou substância pessoal (ver texto 213)).
         Se isto é assim na tradição oriental, bem diversa é a posição do ocidente em relação à nossa alma e à nossa vida. Os próprios estóicos, que tinham por lema moral absterem-se e aguentarem duramente todas as privações e sofrimentos corporais e mentais, eles suportavam tudo isso para salvar a sua vida, a sua única vida, e não para dela se irem desfazendo. Enquanto os estóicos amam a vida e por isso é que aceitam privações e sofrimentos, para os budistas a vida é o grande mal do qual é preciso sair o mais depressa que for possível, através das tais transmigrações.

         3 - É interessante notar que krishnamurti, instrutor espiritual de renome mundial nascido na Índia mas educado e depois sempre vivendo no ocidente – assim quase uma ponte entre os dois mundos -, dizia muitas vezes que “a vida humana é uma coisa muito estranha”. Será que o sentido desta frase terá em fundo a crença na transmigração das almas? Acreditaria ele em tal transmigração? Em resposta a estas perguntas, basta ouvi-lo a falar e a dizer: “A crença é a negação da Verdade; a crença impede a Verdade (…) porque a Verdade é o desconhecido, e acreditar ou não no desconhecido é uma simples projecção pessoal e portanto não é real” (em O Sentido da Liberdade, p. 192). Note-se, porém, que, segundo esta sua opinião, tanto acreditar na transmigração como não acreditar é projecção mental e não realidade.

Há ou não há, então, para nós, transmigração das almas? Atendendo ao que acima fica escrito sobre o assunto, consideramos perfeitamente justificada em termos racionais – já não é crença ou fé, portanto, mas razão – a opção pela não existência da transmigração das almas.

domingo, 21 de junho de 2015

307.1 (de 3) - A Transmigração das Almas

1 - Olá, amigas e amigos! Ainda há quem aceite a transmigração das almas. Antes de mais, porém, definamos os termos. Alma é toda a nossa vida mental, na qual até podemos distinguir propriamente a alma (como centro das paixões que do corpo a ela sobem) e o impassível espírito. Transmigração, por seu lado, significa que essa nossa alma - que é toda a nossa vida mental - habitará vários corpos que até podem não ser humanos, durante todo o seu longo ciclo de vida.

         Poderá então defender-se, de acordo com tal doutrina, que as almas andam por aí vagueando pelo universo, à espera de incarnar num primeiro ou num novo corpo? Não, porque nem sequer se pode pensar uma alma humana (uma vida mental), sem também se pensar no seu próprio e único corpo. Não se fazem corpos para almas, nem almas para corpos. Não há almas soltas e separadas do seu corpo. Para elas poderem subsistir vivas depois da morte (pelo menos do seu corpo), seria preciso que, de alguma forma para nós ainda desconhecida, elas continuassem ligadas ao seu próprio e único corpo. Porque o corpo não é, de todo, um mero receptáculo, uma barriga de aluguer para a alma. Pois que é do corpo, e de mais sítio nenhum, que brota a flor ou se acende a luz que é a nossa vida mental. Na verdade, o corpo - com seus sentidos, sangue, experiências e apetites -, é alimento da alma, seu cúmplice, seu dialogante parceiro tantas vezes acalorado a defender perante o espírito aquilo que deseja.

quinta-feira, 18 de junho de 2015

306 - O Muito e o Pouco

Entre a morte assistida e a vida assistida até ao fim
vai muito e vai pouco, e o muito é que aqui
se respeita a vida até ao fim, pois ela nos transcende


domingo, 14 de junho de 2015

305 - A Urgência do Tempo

Os anciãos não vão, mas estão, em seu agora:
e os jovens não fazem também o mesmo

quando estão em aporias intransponíveis?

quinta-feira, 11 de junho de 2015

304 - Fora, é um Sopro

O amor, esse valor dos valores entre os humanos,
só é real no amante ou nos amantes:

fora deles, é um sopro

domingo, 7 de junho de 2015

303 - Só

Depois de muitos tratamentos agressivos, todos vãos,
ela pediu só cuidados paliativos, a que o médico anuiu,

também ele irmão na mesma humanidade mortal

quinta-feira, 4 de junho de 2015

302 - O Sentido da Vida

A razão para viver, ou o sentido da vida
está em sabermos transcender-nos:

mesmo a cuidar duma planta ou dum gatinho