sexta-feira, 27 de setembro de 2013

182 - O Grande Desígnio

Há o desígnio, diz-se, ou a ínsita intenção,
de o mundo produzir o ser humano,
e mesmo existir primariamente para ele

Para quê, então, os dinossauros e outros animais gigantes,
mas também as importunas moscas e melgas,
e ainda, é claro, a insidiosa serpente,
todas tanto, as três, incomodando os humanos?

Não seria mais convincente ter aparecido,
em primeiro lugar,
não sujeita a tanta demora evolutiva,
a criatura humana?

E agora, porque não hão-de vir a existir
outros estádios de evolução,
para além do ser humano?

Porque é que, quando a pujança juvenil
nos vai abandonando,
logo damos em ser invadidos
por bichinhos destruidores?

E quanto ao vasto universo,
do qual o nosso mundo é um pontinho minúsculo,
todo ele existe também para o ser humano?
ou será a vida um produto acidental no universo,
e fortuita “esta mistura de vícios e virtudes”?

“Podem demonstrar-se as boas intenções do universo”,
pela razão de termos aparecido, embora tão tardiamente?
Pode alguém vangloriar-se destas suas criaturas?
Um mundo de rouxinóis e rolas,
ou de abelhas doces e diligentes formigas,
ou mesmo de cigarras soprando a sua buzina ao sol,
não seria muito menos violento e destruidor,
muito mais belo que este nosso mundo humano?

Não podíamos ser um pouquinho mais modestos
e menos presumidos,
em vez de nos pensarmos o topo e a razão do universo,
nós os habitantes, pequeninos e frágeis,
deste minúsculo cantinho nessa imensidão?
Seres insignificantes, e tantas vezes mesquinhos, como somos?


Texto inspirado em Science et Religion, de Bertrand Russell

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