sábado, 14 de janeiro de 2012

50 - O Mito do Andrógino Original

Olá! Lembram-se de termos falado há dias (48), de raspão, daquela pretensa e actual 2ª edição do andrógino original, não lembram? Falemos então hoje da 1ª edição desse andrógino original, um mito muito interessante que nos foi legado por Platão.
A segunda história mitológica de O Banquete (49), pela qual se vê que o ser humano é carência e desejo, é o mito do andrógino original, que Platão, sem guardar ressentimentos, põe na boca da personagem Aristófanes, correspondente ao real comediógrafo grego do mesmo nome, que teria sido um dos acusadores de Sócrates aquando da morte deste, e é autor de As Nuvens, peça em que, também aqui, satiriza este primeiro filósofo.
Conta então Aristófanes, já muito metido nos copos, que outrora os homens eram duplos, com duas cabeças, quatro braços e quatro pernas. Eram os andróginos originais, quer eles fossem homens de um lado e mulheres do outro, quer ainda duas vezes homens ou duas vezes mulheres. E eram tão poderosos que construíram uma torre gigantesca para conquistarem o Olimpo dos deuses.
Perante isto, os deuses decidiram punir essas criaturas orgulhosas, e o castigo foi dividirem cada um deles em dois, assim criando homens e mulheres como hoje os temos. É por isso que, desde então, todos levam na terra uma vida errante, à procura da sua metade perdida. E quando a encontram é o êxtase, não parando de se amarem e desejando fundir-se um no outro, assim fazendo um só ser como eram no início.

Vêm agora mil perguntas sobre estes dois mitos apresentados por Platão. Comecemos pelo primeiro (mito de Eros), mas já sem negligenciar o segundo:
+ Porque é que Sócrates dizia sempre que nada sabia? E porque é que ele tinha sempre opiniões contrárias às dos outros? E porque é que foi acusado de desencaminhar a juventude?
+ Atendendo a que os dois mitos nos apresentam várias fontes de prazer (festa, comida, bebida, erotismo, sexo, convívio, dissertação sobre assuntos espirituais, êxtase de amor…), podemos perguntar: O que será o prazer? Será ele tão mau (ou tão bom) como às vezes o pintam? Será ele realmente diferente das coisas que dão prazer?
+ Existirá mesmo a vontade, para aceitar ou rejeitar os prazeres, ou haverá somente a inteligência, para decidir sobre eles e os regular?
+ A chamada “força de vontade” não será só a maior ou menor convicção ou determinação da inteligência, que também diligencia pela regulação do instinto?
+ Não será necessário, por vezes, a inteligência rejeitar alguns prazeres e aceitar mesmo a dor, para depois se terem prazeres mais intensos e duradoiros, ou evitar dores maiores?
+ E quando nós, irremediavelmente, temos mais dores que prazeres, não nos diz a inteligência para as aceitarmos, para que assim ainda possamos usufruir daqueles?
+ Porque é que os prazeres espirituais são tão pouco cultivados, eles que podem ser tão intensos? Não será por falta de educação?
+ Não estará toda a ética ao serviço do prazer?
+ Será que os “poros” da nossa pele têm algo a ver com o nome do deus que foi pai de Eros? E o significado da palavra “penúria”, por exemplo, pode relacionar-se com o nome da mãe desse deus?
+ Que significado haverá em ter Eros nascido de um deus embriagado?

Perguntas agora, em relação ao segundo mito:
+ Platão não guarda ressentimentos contra Aristófanes, mas não vai à bola com ele! Assim, sendo este o narrador desta história, porque é que o autor o põe bêbedo a contá-la?
+ Na comédia As Nuvens, o autor apresenta Sócrates numa cesta, no ar, ou seja, nas nuvens. Porque terá ele feito isso ao filósofo? Esse artifício terá semelhanças com a mensagem do filósofo?
+ Que significado terá a expressão, por nós ainda hoje usada, “encontrei a minha cara-metade”? Terá a ver com este mito?
+ Que dizer dos casais homossexuais, à luz deste mito? A possibilidade das uniões homossexuais estará aqui contida?
+ Haverá relação entre este mito e a maternidade de substituição, entre nós recentemente legalizada?
Concluamos agora tudo o que queríamos dizer sobre estes dois mitos, que nos falam da incompletude ou congénita carência do ser humano. Não será o amor, o verdadeiro amor, o remédio para aquelas e o caminho para a plenitude? O amor … e o pensamento, o amar e o conhecer, porque amar e conhecer são dois em um, como já vimos (textos 14 e 15)!

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